Leitura política
«À política o que é da política, à justiça o que é da justiça» é um belo refúgio para não reconhecer o óbvio: o caso José Sócrates tem de ter leitura política. Da mesma forma que a presunção de inocência é válida a titulo pessoal, mas a política está para além dela, no sentido em que um político não pode, nem deve, refugiar-se nela (volto a lembrar que a propósito do caso da demissão de Miguel Macedo houve quem procurasse constatar que a sua demissão era coisa normalíssima - e eu acho que o devia ser -, mas repito que isso ainda está por provar). Sem que a situação do ex-PM, que pode muito bem acabar por não ser condenado - não é isso que está em questão -, não mude, torna-se inadmissível que o PS continue sendo representado e dominado por socráticos. Ainda que esses socráticos tenham sido a principal força dentro do PS a provocar a queda de Seguro e a garantir a ascensão de Costa, o que coloca problemas evidentes ao actual líder. Contudo, se Costa é mesmo um líder forte e assim quer apresentar-se, tem agora a oportunidade para mostrar o que vale. Nem quero imaginar que, em 2015, com Sócrates a braços com a justiça, a campanha para as legislativas por parte do PS seja conduzida por socráticos ou que um futuro governo do PS tenha no seu núcleo duro socráticos - entendam-se os socráticos como aqueles que sempre rodearam o querido líder, tendo para com ele até relações de amizade; gente que foi promovida de forma sistemática dentro do PS por este; e que fez da defesa da honra de Sócrates uma das suas causas -, é inadmissível. Tão inadmissível como imaginar que Paulo Portas seria apanhado nas teias da justiça com o caso dos submarinos e, tirando o afastamento de Portas, tudo no CDS ficasse igual. Imaginam que assim seria? Achariam admissível que assim fosse? Se um partido não demonstra verdadeira capacidade de regeneração quando a necessidade desta é por demais evidente, esse partido não vale nada. E aqui, sim, essa incapacidade dos partidos de se regenerarem, isso é que coloca em causa, a prazo, o regime. Já a justiça seguir o seu rumo - investigando, acusando e condenando, quem quer que seja, se assim tiver de ser -, se alguma coisa, é sinal de vitalidade do regime.