Ler os outros (CXLIII)
Compete ao Governo ser mau para que todos possamos ser bons.
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Compete ao Governo ser mau para que todos possamos ser bons.
Se basta fazer cair este Governo e aplicar uma política milagrosa, não me perguntem qual, para o desemprego começar a baixar; os salários a subir; o défice passar a superavit; a dívida diminuir; o crescimento aparecer em força; quiçá, para voltar a colocar em cima da mesa os projectos do aeroporto e da alta velocidade; ah, o progresso!; estamos à espera do quê? Meu caro Passos Coelho, assim que te derem um pretexto, demite-te, não percas mais tempo, entrega o país a outro pateta. Depois, os comediantes do costume passarão a culpar outro pateta que não tu pela ausência da política milagrosa. A culpa, evidentemente, nunca será dessa tal política que eles vendem, de forma mais ou menos deliberada, ser mera ficção. Mas deixa lá isso Passos, a verdade é que também foste para o poder vendendo ilusões e já diz o povo: «quem com ferros mata, com ferros morre». Ao menos, sairás com a consciência tranquila de quem tentou, ou foi forçado a, resolver os problemas do país e não de quem os agravou deliberadamente, como foi o caso de quem te antecedeu. Por falar em quem deliberadamente agravou os problemas do país: PS ao poder tão cedo quanto possível, para já no orçamento de 2014 retrocederem todas as medidas impopulares a que os socialistas se tem oposto, aumento da carga fiscal incluída - ou será que não será nada disto e um PS no poder manterá praticamente intactas, para não falar em agravamento das mesmas, as medidas levadas a cabo por este Governo? Ah, o que me vou divertir! Garantido é que imune ao que quer que aconteça no futuro, os comediantes continuarão a ter o seu espaço e a mandar bitaites por tudo quanto é órgão de comunicação social. A SIC agora, assisti ontem mesmo no jornal da noite, até já exibe orgulhosamente Baptista da Silva como o burlão por eles desmascarado. Não há remédio.
«Cabe ao Estado garantir a existência de um serviço público de televisão». Uma RTP minimalista, tipo RTP2, e está o problema resolvido. Mas o que importa perguntar é o seguinte: «quem tem a coragem para impor feliz disciplina financeira nas empresas públicas, sorvedouros sem fundo de dinheiros públicos, e promover a privatização de parte da RTP?», tal como perguntava um certo Cavaco Silva no dia 18 de Maio de 2001 em discurso proferido na Universidade Portucalense. Mas esse mesmo Cavaco, nesse mesmo discurso, também explicava que «os decisores políticos são pessoas normais e, como tal, têm receio da reacção da opinião pública, para além de certo nível». Enquanto Presidente, Cavaco tem demonstrado este último ponto através do seu próprio exemplo. Temos o melhor Presidente que podiamos ter dado o leque de escolhas que nos foi apresentado, mas está muito longe de ser o Presidente de que precisávamos. Faltou-lhe e continua a faltar-lhe coragem.
Nota: depois basta uns pozinhos de magia jornalística para passarmos do "Cavaco Silva contra privatização total da RTP" do Público para o «Cavaco pronuncia-se contra a privatização da RTP» da própria RTP.
Há cada vez menos nascimentos em Portugal, mas tal não se deve propriamente à austeridade da troika. É que basta olhar para o histórico. No gráfico há dois booms, mas tal como era explicado hoje no noticiário da SIC, o primeiro deve-se aos retornados e o segundo à vaga de emigrantes de leste para a construção civil promovida pelo cavaquismo/guterrismo. Nenhum desses dois momentos ensina-nos o que quer que seja sobre o que é necessário para voltar a aumentar os nascimentos em Portugal: foram períodos circunstanciais, não prolongáveis no tempo. Certo é que não é preciso ser um génio para compreender os problemas que a tendência de queda de há muitos anos levanta ao nível da tão badalada solidariedade intergeracional. Francisco Proença de Carvalho faz aqui um texto bonito em defesa dos «que já não têm força para emigrar», o pior para estes é que muitos dos que têm força para emigrar estão a fazer isso mesmo, a emigrar. E se em nome de princípios que ficam bem no papel, são muitos os que vão continuar a ignorar a realidade, esperem pela pancada.
«President Summers asked me, didn’t I agree that, in general, economists are smarter than political scientists, and political scientists are smarter than sociologists?» Lembrei-me de Larry Summers a propósito disto. Caro Filipe, trata-se de uma jornalista formada em sociologia. É preciso dar um desconto.
Para acompanhar isto.
Se o artigo 29º ou 77º foram declarados inconstitucionais pelo tribunal político que tem a cobertura política do velho marreta, não resta alternativa ao Governo que não demitir-se. Que deixem a outros a tarefa de fazer uma consolidação orçamental que estará cada vez mais forçada a ser feita pela via do aumento de impostos generalizado a toda a população portuguesa. Um aumento ainda maior do que aquele que já está consagrado no actual orçamento. O homem do sistema, funcionário público toda a vida e pensionista acima de Presidente, professor doutor Aníbal Cavaco Silva, a quem dei o meu voto e tornaria a dar, será o vencedor desta batalha, mas a guerra ficará longe de estar terminada. Entretanto, crescimentistas ao poder! E percebe-se, cada vez melhor, o silêncio de Cavaco ao longo do seu primeiro mandato: um misto de defesa dos seus interesses pessoais, era preciso assegurar a reeleição, e concordância com o caminho que o outro seguia.
Um velho marreta como presidente do clube dos pensionistas. O Gérard Depardieu que calhou na rifa a este Governo chama-se Cavaco Silva. Com a diferença que o francês mudou de residência e protestou contra o aumento de impostos e o português ocupa a presidência e protesta contra a diminuição das prestações sociais, nomeadamente a relativa às suas parcas reformas. Se a decisão política do TC for substancialmente adversa ao Governo - por substancial entenda-se uma decisão com impacto orçamental significativo -, este nem deve pestanejar: crise política, venha ela. Por fim, permitam-me reafirmar que este tipo de crítica é um hino ao socialismo português: «Todos serão afectados, mas alguns mais do que outros, o que suscita fundadas dúvidas sobre a justiça na repartição dos sacrifícios». Mas porque carga de água é que uns não podem/devem ser mais afectados do que outros? Anos e anos a fio a beneficiar uns em prejuízo de outros e nunca o Tribunal Constitucional foi chamado a pronunciar-se. Que infelicidade terem descoberto este conceito de justiça tão tardiamente e só quando lhes tocou a eles não ficarem por cima.
Notas:
1. O Chefe de Estado prescindiu do seu vencimento de 6.523 euros e optou por reformas de 10.042 euros