Flexibilização salarial
Não há debate que provoque mais asneiras e demonstração de ignorância do que o do mercado de trabalho e da flexibilização salarial. Nos últimos trinta minutos li uma dúzia de textos, vindos das mais variadas pessoas; das mais variadas tendências; dos mais variados sectores; sobre o tema que conseguiram a proeza, todos, sem excepção, de provocar em mim irritação pelo seu conteúdo de tiro ao lado. Não sei se o tema é difícil de perceber ou se há quem não o queira perceber, mas sei que assim é difícil chegarmos a algum lado. Vou ficar-me por um, de uma pessoa habitualmente sensata e ponderada, a Helena Garrido, que escreve a certa altura: «um economista de mente aberta, colocado perante a observação de redução dos salários por efeito das forças do mercado, ficaria, não se pode dizer satisfeito, mas animado pela flexibilidade da economia. Um país que se adapta é capaz de ultrapassar as suas dificuldades mais rapidamente», absolutamente de acordo, mas, cara Helena, ou bem que há significativa flexibilidade salarial e, «usando a ferramenta mais popular entre economistas», os salários já foram parar ao ponto de equilíbrio de mercado; ou bem que não há e o grau de queda dos salários está longe de ter ajustado ao valor de equilíbrio do mercado. Sei que sou insistente, mas a esse respeito torno a lembrar isto: O Nobel da Economia defende que os salários dos países periféricos da Europa, tais como Portugal e Espanha, precisam de baixar entre 20% a 30% face aos da Alemanha. Isso, já aconteceu? Essa é que é a resposta que devíamos procurar. É que como o FMI não pode pôr-nos a aumentar a inflação, nem pode impor aumentos salariais aos alemães, resta-lhe pedir que flexibilizemos o nosso mercado de trabalho na expectativa de que os nossos salários baixem (ainda mais).