A esquerda e a aritmética
Ainda sobre Silva Lopes, «a great, good, and incredibly likable man», nas palavras de Paul Krugman, leio esta frase dele [daqui]: «Em Portugal, querem que o Governo gaste mais, não querem que o Governo aumente os impostos e querem que o Governo tenha um défice mais pequeno. Ora, isto é uma impossibilidade aritmética. E, no entanto, as mesmas pessoas, o mesmo grupo, o mesmo partido, querem estas coisas ao mesmo tempo. Este tipo de situações ilógicas é que nos levou a isto.» E penso: em boa parte, a ideia de que a esquerda não percebe de matemática/economia, sempre me pareceu uma coisa caricatural, pessoas como Silva Lopes ou, para dar outro exemplo, Teodora Cardoso, estavam ai para desmentir inequivocamente essa ideia. Mas no discurso político de alguma malta de esquerda nos dias que correm, estes economistas passam por «neoliberais». Claro que à esquerda sempre existiram alguns sectores mais radicais, da extrema-esquerda, que nunca gramaram o posicionamento dos Lopes e das Cardosos desta vida e facilmente os identificavam com a direita, mas no PS, ao menos nesse, não era assim. Agora, mais depressa apanho um socialista contente com o novo poder em Atenas e a identificar-se em larga escala com este do que a citar em concordância convicta um Silva Lopes ou uma Teodora Cardoso. Meus caros socialistas, reconhecer que os recursos são limitados não impede ninguém de ser socialista. Pelo contrário, permite ter um entendimento mais claro sobre a fronteira de possibilidades que determinada economia oferece e adaptá-la o melhor possível às preferências ideológicas. Depois da economia rebentar três vezes desde 1974, já era tempo da maior parte das pessoas, inclusive as de esquerda, ter percebido isto.