Lisboa como trampolim
Há um argumento usado pelos críticos de António Costa que considero particularmente irrelevante ou, ainda melhor, relevante no sentido inverso ao que apontam. É esse argumento o que se prende com o facto deste, ao disputar a liderança do partido e, por conseguinte, pretender concorrer a primeiro-ministro, não corresponder às expectativas nele depositadas pelos eleitores lisboetas e deixar pelo caminho um projecto com o qual está comprometido. Este mesmo argumento foi usado contra Paulo Rangel, acabado de triunfar numas eleições europeias, na disputa interna com Passos Coelho e sempre o considerei estúpido. Muitas das vezes irritam-me os candidatos sem provas dadas fora da política, mas não é menos irritante achar que quem deu provas de ser bom político - e alguém só pode provar ser bom político ganhando eleições e exercendo cargos políticos -, ter nisso algo que o diminui. António Costa ganhou as eleições de Lisboa e ganhou-as bem. Foi a novas eleições e foi reeleito: os eleitores gostaram do trabalho que fez à frente da câmara. Isso não o deve impedir de sonhar com voos mais altos, antes pelo contrário, e os habitantes de Lisboa só se deviam sentir ofendidos ou desiludidos se, porventura, achassem que o novo cargo a que Costa se candidata está num patamar de inferioridade ao de edil lisboeta, mas ainda não vi ninguém argumentar isso. Alguns dirão que tenho razão na mais-valia política que representa a vitória nas eleições e a boa avaliação feita à posterior pelo eleitorado sobre a obra realizada, mas António Costa poderia ter usado esse mesmo capital político para chegar a PM quando já não exercesse o cargo na Câmara de Lisboa. Devia cumprir o mandato até ao fim. Não pode ser assim porque na política o timing é tudo. E para Costa, como para Rangel naquela altura, este é o timing certo. Não inventemos barreiras à disputa interna dentro dos partidos onde elas não devem existir. Os partidos já estão suficientemente fechados sobre si mesmos, não os fechemos ainda mais.