O PS a debater com ele próprio
Alguém mais distraído podia pensar que o debate de hoje foi essencialmente entre António Costa e Catarina Martins, mas a jovem actriz esteve muito bem no seu papel de confrontar o PS com a sua própria retórica. Antes disso, ainda esclareceu uma confusão de Costa recente, a de que só a direita questiona o PS: de tal forma que às tantas, no debate sobre a segurança social, até fiquei com medo que Costa atirasse à cara de Catarina, por esta questionar as contas do seu programa económico (o «estudo», como Costa gosta de lhe chamar), que esta era a porta-voz de Passos Coelho. O Porfírio - sempre brilhante, como neste forte ataque a Ricardo Costa - deve ter ido logo investigar se a líder do BE também é sobrinha de Dias Loureiro (um dia chegaremos aos amigos e ex-compadres deste activo tóxico, num país onde a elite dorme toda uma com a outra). Mas a parte mais interessante do debate, aquela onde Costa foi verdadeiramente encostado às cordas, foi quando Catarina Martins atirou-lhe à cara que, tal como ele, também tinha ficado contente com a vitória do Syriza, tendo passado os minutos seguintes a debitar a retórica que os socialistas e os apoiantes de Costa usaram vezes e vezes sem conta contra a governação da actual maioria. Costa fazia sorriso pateta; Catarina esfregava as mãos de contente. Costa lá teve de ir, a contragosto, para a linha mais evidente de ataque ao BE, a mesma que Passos e Portas usaram tão bem: a hecatombe da governação syrizica (Costa tentou usar o debate para demarcar-se da direita, mas acabou colando-se na argumentação a ela). O «choque com a realidade», chamou-lhe Costa. Só que como negar que esse «choque» também serve aos socialistas? Do Pedro «até tremem as pernas» Santos; passando pelo João «sei mais e sou mais arrogante do que o Krugman» Galamba; ao Ferro «manifesto pela reestruturação da dívida» Rodrigues? Disse ainda Costa que quem governa não pode estar preso a retórica fútil e irresponsável: muito bem, mas ao quê que se agarrou o PS nos últimos quatro anos se não a isso mesmo? Ainda se agarra, o que é triste. É uma pena que Costa só se lembre de nos lembrar que a realidade é muito mais complexa do que aquilo que algumas frases tontas proferidas abundantemente por alguns esquerdistas nos querem dar a entender quando apanha a líder do BE pela frente.