Victim blaming
Imaginem que passo a deixar o meu Opel Corsa destrancado sempre que o estaciono em algum lado. Se for roubado (o carro em si ou artigos que estejam dentro do mesmo), o ladrão é que cometeu o crime, mas nem por isso, perante aquilo que me era possível antecipar com os dados conhecidos, deixei de ser estúpido. Imaginem ainda que em vez de um Opel Corsa o meu carro é um Ferrari, mais estúpido estou a ser se não me assegurar de que o mantenho trancado. Com um Ferrari, conviria mesmo que o carro dispusesse de mecanismos de segurança próprios contra furto (alarme, etc.). Vem esta conversa a propósito disto. Embora alguns interpretem de outra forma, não retiro das declarações da polémica do provável futuro comissário - pessoa cujas habilitações para a pasta merecem ser questionadas, sem dúvida - a ideia de que não terá existido um crime no caso em apreço, mas antes que tinha de existir conhecimento prévio por parte das celebridades dos riscos em que incorriam ao procederem ao armazenamento das suas fotos privadas num sistema que pode ser acedido a partir de qualquer parte do mundo [o que também coloca questões interessantes ao nível da descoberta do(s) criminoso(s)]. Risco incorrido que acabou por resultar em prejuízo pessoal. Perceba-se: quem se apropriou dessas fotos e as divulgou cometeu um crime? Sim, mas nunca conseguiremos evitar todos os crimes e, com base nesse pressuposto, convém que ninguém se meta a jeito de virar vítima. Dito isto, não tendo sido este um caso virgem e imaginando que as celebridades - e não só - continuarão a armazenar fotos privadas - que pretendem que se mantenham privadas - em mecanismos semelhantes colocados na internet sujeitos a igual risco, se outros casos aparecerem, querem impedir-me de achar que essas celebridades estão a ser, vá lá, ligeiramente estúpidas? «Fool me once, shame on you; fool me twice...»